MARINA DAS TRANÇAS
Marina era uma indiazinha xavante de doze anos. Desde bem pequena, acostumara-se a dividir seus cabelos em quatro partes e a trançar cada uma delas. Aos poucos, as tranças finas da menina Marina tornaram-se volumosas, perfumadas, brilhantes e muito negras.
Um dia, sua mãe pediu-lhe que fosse à floresta buscar água, raízes e lenha. Marina levava um pote para a água, um baquité para a lenha e as raízes e seu pequeno machado de pedra.
Dirigiu-se primeiro à Cachoeira Grande, mas, assim que mergulhou o pote na água, aconteceu... a cachoeira secou, não havia mais uma gota de água onde antes deslizava uma enorme cascata.
Marina, a menina das quatro tranças, pediu:
- Cachoeira, dá-me sua água para eu matar a sede do meu povo.
Mal havia acabado de falar, ouviu um grande rumor que saía das altas pedras:
- Marina, dá-me em troca uma de suas tranças, a mais grossa, para que minhas águas nunca percam o volume.
No mesmo instante, Marina cortou uma de suas tranças com seu machado de pedra e a atirou no leito, agora seco, do rio. Antes que a trança atingisse o solo, as águas começaram novamente a jorrar, ainda mais barulhentas, grossas e límpidas. Marina recolheu a água no pote, colocou-o sobre a cabeça e continuou seu caminho.
A próxima parada foi no campo de lenha. Avistou por ali muita lenha seca e firme, própria para o fogo, mas, quando se abaixou para coletá-la, aconteceu... começou a cair uma garoa que imediatamente molhou toda a lenha, tornando-a úmida e esverdeada.
Marina, a menina das três tranças, disse:
- Sol, dá-me seu calor para eu poder levar o fogo para o meu povo.
Em seguida às suas palavras, ela ouviu uma voz de trovão, vinda das nuvens:
- Marina, dá-me uma de suas tranças, a mais brilhante, para que meus raios nunca se apaguem.
A menina rapidamente cortou outra de suas tranças e a atirou para o alto. As nuvens, então, se abriram e deram passagem para os raios do Sol que, em pouco tempo, de tão fortes, secaram a lenha. Marina recolheu o que pode e seguiu em frente.
Agora só faltavam as raízes para Marina poder voltar para a aldeia. Chegando à roça das raízes, Marina abaixou-se para colhê-las, mas, mal havia encostado seus dedos nelas, aconteceu... a terra virou lama e escondeu todas as raízes em seu ventre.
Marina, a menina das duas tranças, implorou:
- Terra, dá-me suas raízes para eu poder levar alimento para o meu povo.
Naquele instante ouviu uma voz vinda do fundo da terra, como um terremoto:
- Marina, dá-me uma de suas tranças, a mais perfumada, para que meus frutos sejam sempre saborosos.
Marina, então, cortou mais uma de suas tranças e a deixou cair. Antes mesmo que a trança roçasse o chão, a terra ofereceu novamente as raízes, ainda mais viçosas e macias. Marina colheu todas que pode, guardou-as no baquité e pensou que já era hora de voltar para casa.
Recomeçando a caminhar, percebeu que a noite começava a cair. Marina apertou o passo, mas não adiantou... a noite desceu sobre ela e a floresta, cobrindo tudo com seu manto negro.
Marina, a menina da única trança, rogou:
- Noite, dá-me sua luz para que eu possa voltar para o meu povo.
A indiazinha ouviu então uma forte voz que envolvia toda a escuridão:
- Marina, dá-me sua última trança, que é a mais escura, para que minhas trevas nunca se acabem.
Marina rapidamente cortou sua última trança e a atirou para o alto. Naquele instante, uma grande Lua nasceu, iluminando o caminho até a aldeia.
Marina, a menina sem tranças, chegou ao centro da aldeia, onde todos a esperavam, ansiosos. Naquela noite, ninguém dormiu: todos ouviam fascinados a história de Marina, saboreando as deliciosas raízes, bebendo da límpida água, aquecendo-se numa colorosa fogueira e apreciando as belas estrelas.
Marina deixou seu cabelo crescer novamente, mas nunca mais fez tranças. Marina não era mais uma menina; Marina era, agora, uma mulher.
Eliana Maciel